domingo, 4 de maio de 2014

O dia em que perdi Senna

Logo de cara percebi que não era um domingo comum, algo estava me dizendo que seria um feriado marcante.
Não via a hora de chegar o final do dia de sábado porque o domingo, o dia 1º de Maio, Dia do trabalhador de 1994. O dia de perder meu último ídolo com vida.
Quando cheguei na casa da velhinha era uma confusão só, ainda estavam se preparando para sair. O combinado éramos sair bem cedo, passar na casa dos velhinhos, pegá-los e ir para o centro de Jacareí, na casa da madrinha, almoçar e matar saudades. Mas logo cedo percebi que o dia estava enrolado.
Não perdi tempo, fui pra sala e liguei a TV. Mais cinco minutos e seria dada a largada do grande premio de San Marino.
Os velhinhos me apertavam para irmos embora , mas eu precisava ver a largada, não conseguia tirar os olhos da TV. Enfim largaram e Airton na pole como sempre saiu bem. Ele durante os dias que precederam a corrida estava preocupado demais com a segurança dos pilotos e até se prontificara em liderar um movimento nesse sentido.
Assim que deu a largada e vi Senna na frente desliguei a TV e corri para o carro. Tinha que chegar logo na casa da madrinha para continuar a ver a corrida. Senna não havia iniciado bem o ano, essa era a terceira corrida e precisava ganhar. Ele tinha o melhor carro, ninguém duvidava da possibilidade dele vencer e eu em espacial, sabia que o veria cruzar a bandeirada em primeiro.
Ao chegar, não mais que dez minutos de casa até lá, mal beijei a madrinha e já pedi para ligar a TV e tive a surpresa de ver a pista com o safety car. Algum acidente acontecera durante o percurso de casa até ali. Respirei aliviado, quando vi que Senna comandava aquela fila enorme ziguezagueando pela pista, buscando manter o aquecimento dos pneus.
No final da sexta volta, comemorei ao saber que ele tinha feito a terceira melhor volta. Esse era o Senna. Nem no retrovisor ele veria seus oponentes, todos muito lá atrás tentando se conformar com as posições restantes. Não tinha como tirar o primeiro lugar de Senna. Ele era o cara.
Mas de repente na sétima volta tudo mudou e aconteceu. Senna passou reto na Tamborello e bateu forte no muro de concreto e acho que com ele bateu também meu coração. Foi um choque, ainda mais por percebê-lo desacordado.
- Meu Deus! - tinha que chamar por Ele, o impacto fora forte demais.
Enquanto via os fiscais chegando para atendê-lo, vi sua cabeça mexer-se. Ela estava bem!
Não. Não estava, fora apenas um reflexo.
Tiraram do carro destruído e colocaram ao lado deste e começaram os primeiros socorros. Meu coração apertou-se ainda mais. O mundo todo via o que acontecia. Tudo parecia muito grave, então chegou o helicóptero e o levou para o hospital.
Levantei-me e desliguei a TV. Chamei os primos pra sair e fomos até um bar próximo da casa. Chegamos e começamos a jogar bilhar. Eu tinha que deixar aquelas cenas para trás. O dono do local também assistia a corrida, acho que todo o Brasil assistia, e eu escutava sem concentração alguma no jogo, ouvia ao fundo as notícias que chegavam a cada instante.
Tudo me parecia estranho e confesso estava com medo. Medo de nem sei o que, mas algo me dizia que tudo estava errado.
Quando me preparava para mais uma jogada, provavelmente novamente desastrada, ouvi a voz de Galvão Bueno informar que havia sido declarada, naquele momento, a morte de Airton Senna.
No mesmo momento joguei o taco sobre a mesa e disse:
- Vamos embora, não tenho mais nada a fazer aqui. - Sai com uma dor aguda no peito, tão forte quanto aquela que senti no dia 16 de agosto, muitos anos atrás, quando perdemos Elvis.
Não chorei, mas o nó que formou em minha garganta parecia querer me sufocar, então já na casa da madrinha, sentei-me na poltrona da sala e perguntei a Ele o porque?
Na verdade eu já sabia da resposta, porque Ele nunca  me falta, mas ainda assim perguntei.
Tudo que veio depois, o funeral inesquecível, comentários e testemunhos, até a última hora, só me comprovaram que eu havia realmente perdido meu último ídolo ainda vivo.
A dor de perder Elvis, Janis, John e Elis, estava de volta torturando meu pobre e já sofrido coração admirador de grande talentos. Naquele momento só me restou dizer: 

- Vá em paz Airton Senna do Brasil. - e então chorei.

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