segunda-feira, 28 de maio de 2018
domingo, 20 de maio de 2018
Quem sou eu...?
Só percebi onde estava muitos dias
depois.
Apenas me
lembro que comecei a desfalecer, senti uma fraqueza no corpo e fim.
Quando abri
os olhos novamente, foi como se não o tivesse feito. Tudo era escuridão, um
vazio e um estranho silêncio. Fiquei imóvel por alguns minutos, tentando
recuperar a razão. Não lembrava do meu nome e nem quem era. Percebi que não
conseguia me mover. Algo em cima de mim, impedia. Meu braço direito estava
livre, conseguia mexê-lo, mas o esquerdo estava debaixo do meu corpo e não
havia espaço para retirá-lo.
Respirei
fundo e senti o ar invadir meus pulmões, mas com ele, trouxe também um cheiro
estranho, como se houvesse ali perto algum corpo em decomposição. O odor era
forte e estranhamente doce. Tentei levantar-me novamente e senti minhas costas
molhadas. Com a mão livre, toquei minhas roupas e meu corpo, ambos estavam encharcados.
Tentei
lembrar meus últimos momentos ou quem era, mas apenas doeu minha cabeça, nada
vinha em minha memória. Quem sou eu? Apalpei com a mão solta o que me
pressionava o peito, não me deixando levantar. Era uma madeira. Forcei um pouco
e ouvi um estalo, a madeira estava fácil de romper. Forcei novamente e ela
partiu-se. Pela forma que facilmente a quebrei, devia estar muito velha ou
estragada. Enfim, estava livre.
Afastei os
pedaços de madeira e consegui sentar. Não conseguia enxergar nada, tudo era
muito escuro. Nem conseguia ver as minhas próprias mãos.
Onde
estava? Que lugar era esse?
O forte
odor ainda incomodava, era um cheiro forte, como de peixe estragado.
Estiquei os
braços tentando tocar algo, mas nada estava a minha volta. Nos pés, senti que
ainda trazia minhas sandálias. Apesar de algumas dores nas pernas, afastei os
restos de madeira ou outra coisa qualquer e estiquei as pernas. Um pouco mais
de esforço e me vi em pé.
Estaria eu,
cego? Mesmo sem nada enxergar dei meu primeiro passo. O chão era macio, apesar
de muito úmido ou encharcado e cedeu quando pressionei os pés ao dar o primeiro
passo. Mais um passo e nada de tocar em algo, além dos pedaços de madeira no
chão.
Girei meu
corpo na posição oposta, mas não tinha nada além da negritude que insistia em
ocultar tudo de meus olhos. Estiquei meus braços movimentando-os para cima e
para baixo, mas fiquei na mesma. Não podia ficar ali, assim, tinha que tentar
algo, talvez me mover mais, descobrir algo que as minhas mãos identificassem e
que diria onde estava.
Quando
tentei meu terceiro passo, esbarrei em algo que tirou meu equilíbrio e cai de
cara no chão. Quando bati no chão, senti que era macio e até morno, parecia uma
pele. Percebi que por isso, apesar de estar todo molhado, não sentia frio
algum.
Tocando o
chão onde cai, encontrei algo que mais parecia uma vara. Segurei-a e apalpei
lentamente. Parecia uma lança ou uma vara com ponta. A apoiei no chão, deixando
a ponta para cima e levantei-me novamente. Segurei na extremidade sem ponta da
vara e a levantei horizontalmente, para ampliar meu alcance e quem sabe tocar
em algo. Girei meu corpo para todos os lados, sem sair do lugar, mas não
encostei ou atingi nada. Seja lá onde estava, não tinha paredes.
Não sabia o
que fazer. Não sabia onde estava e nada enxergava.
Por um
momento pensei em seguir caminhando, mas poderia cair novamente e talvez até me
machucar gravemente. Sentei no chão para pensar.
Diante de
tudo que tinha passado e sentido, só podia ter acontecido uma coisa...
O silêncio,
a escuridão, o odor forte de algo ruim, a enorme umidade, as madeiras sobre
mim...
Admiti. Eu
estava morto!
Então, era
assim que tudo terminava?
Meu Deus,
seria assim o meu fim?
Fui ficando
extremamente nervoso e me vi perdendo a razão, não podia ser isso.
Gritei não
aceitando aquilo e comecei a bater com a vara no chão. Comecei enfim, a chorar.
Sentindo aumentar a pressão e o desespero, levantei-me e comecei a girar e
pular, gritando inconformado: Por que? Por que? E no auge de meu desespero, sem
pensar, atirei a vara como se arremessasse uma lança. Um segundo depois senti
uma vibração. Para minha surpresa não ouvi a vara cair e então tudo começou a
se mexer e balançar.
Tentando
manter o equilíbrio e não cair, meus sentidos me chamaram a atenção para um
barulho bem longe, mas que parecia vir em minha direção. Com ele chegava
também, agora mais forte, aquele cheiro ruim.
Essa era a
minha morte e sentia que algo vinha me buscar.
Com tudo se
movendo a minha volta, só pensei em ajoelhar e rezar, pedir perdão pelos meus
erros e teimosia. Quase que no mesmo momento, começou bem longe aparecer um
pequeno feixe de luz, enquanto o barulho aumentava em minha direção. Estava
mais próximo, estava chegando a minha hora.
Meus olhos,
por muito tempo acostumado com a escuridão, demorou para adaptar-se com aquela
luz que surgia. O barulho que vinha da direção oposta da luz, estava próximo
demais. Virei-me para vê-lo, então rapidamente pude ver a vara que lancei,
fincada numa parede vermelha, sem ter tempo para entender aquilo, algo como uma
onda gigante me atingiu em cheio e arrastou-me para a luz.
Fiquei meio
tonto e me vi voando. Teria virado um anjo? Vi o céu, o sol e até uma praia,
muito perto dali, antes de cair. Despertei-me afogando e percebi que estava no
fundo de um mar. Bati braços e pernas subindo ao encontro da luz. Subi até sair
e consegui respirar. Agarrei-me num barril que boiava ao meu lado,
provavelmente fora lançado comigo. Olhei em direção à praia e comecei a nadar.
Agora sim
entendi, obrigado Senhor.
Quem sou?
Eu, sou
Jonas.
E meu
túmulo... Era uma baleia.