Eram muito marcantes os Natais naqueles dias...
Começava dezembro e lá íamos nós, preparar a montagem do presépio da capela.
Capela São Francisco de Assis, na Vila Guarani, minha segunda casa na época.
Como as celebrações sempre aconteciam aos domingos, tínhamos que montar o presépio no sábado para que todos o vissem na manhã seguinte. Essa tarefa era responsabilidade do grupo jovem da capela, a CJSFA-Comunidade Jovem São Francisco de Assis.
Como todos os anos, a expectativa era sempre grande. Todos queriam ver o que aprontaríamos, o quanto a montagem do presépio seria diferente do ano anterior, então eu e mais alguns amigos nos trancávamos na capela e começava o trabalho.
Já há alguns anos atrás, comecei uma novidade, esconder o menino Jesus no presépio. Eu entendia que, como Ele só nasceria na meia noite do dia 24, não poderia ficar exposto no presépio, então o escondia. Achava um cantinho, ali mesmo no presépio, entre alguns detalhes da montagem, sempre em lugar que um bom observador o encontraria, e o deixava aguardando sua hora. Depois da celebração de Natal, geralmente acontecia depois das 20:00, todos se cumprimentavam e iam para casa. No meio daqueles abraços, cumprimentos e movimentações, saia sorrateiramente até o presépio e colocava o menino Jesus na manjedoura.
Depois de alguns anos, começou a busca ao menino Jesus oculto. Sempre quando terminávamos a montagem do presépio, só escondia o menino Jesus depois que todos saíssem da daquele espaço. Cinco minutos depois, estavam todos em volta do presépio procurando onde eu o havia escondido. Mas naquele que seria o último ano...
Passamos a tarde e o começo da noite daquele sábado concentrados na montagem. Como sempre fazíamos algo diferente, naquele ano alguém sugeriu fazer um céu suspenso sobre o presépio. Com muita criatividade conseguimos realizar tal façanha. Ficou muito bonito com nuvens de algodão e muitas estrelas tendo ao fundo um céu azul marinho.
Ao terminar a montagem, com todos bastante cansados, afastei uns dez passos para apreciar o todo. Na verdade buscava um local para repousar o menino Jesus. Percebi que todos me observavam, já esperando o sinal para saírem, mas os surpreendi.
- Muito lindo. Vamos embora descansar, amanhã o dia promete.
- Mas e o menino Jesus?
- Já o coloquei. - Disse sentindo-o com as pontas dos dedos em meu bolso.
Todos se voltaram para o presépio e começaram a busca. É claro, neste ano ninguém o achou. Fomos embora.
Na manhã seguinte enquanto preparávamos a capela para a celebração da noite de Natal e ensaiávamos as canções, sempre um dos amigos aproximava-se e perguntava:
- Cadê Ele? - A resposta sempre era a mesma...
- Ainda não nasceu.
Meu saudoso e querido amigo Julião, um senhor guardião da capela, dos jovens e de tudo que cercava aquele templo, era o mais curioso e constantemente me cercava com a mesma pergunta e ouvia a mesma resposta.
- Não sei, afinal, Ele ainda não nasceu. - Dizia pensando naquela pequena imagem de um menino Jesus criança, muito bem guardado na minha caixa de segredos, no fundo da minha gaveta de roupas.
Chegou a noite e nos encontramos na capela.
Já no meio da celebração, sabia que fora uma das mais lindas que participei. As pessoas, as canções, tudo estava perfeito. Sem duvida foi uma linda celebração de Natal. Podia-se sentir a alegria, felicidade, o Natal, a presença do menino Jesus... Meu Deus o menino Jesus!
Havia esquecido de traze-lo. O menino Jesus não estaria presente quando tudo terminasse.
Minha casa era muito longe, não dava para buscá-lo. Comecei a suar. Já não conseguia me concentrar nas canções ou na própria celebração. Sabia que quando terminasse, muitos iriam ver o menino Jesus na manjedoura e não o encontrariam, automaticamente me procurariam. O que eu iria dizer? Esqueci-me de Jesus?
Julião passava por mim e silenciosamente perguntava: - Onde você o colocou? - nervosamente só contorcia o rosto.
A cada canção que terminava colocava o violão ao lado, olhava para o presépio, depois para o Julião, ele sempre sorrindo, sabia que Ele não estaria lá quando tudo terminasse. Então a celebração terminou.
Depois de cumprimentos e abraços lá foram todos ver o menino Jesus. Todos, menos eu.
Lá do presépio alguns me olhavam e sorriam. Alguns vieram em minha direção e sorrindo perguntaram:
- Quando você o colocou lá? Estávamos de olho em você.
- Coloquei? - Surpreso larguei do violão e fui ver o presépio.
Lá estava Ele. Entre Maria e José, cercado pelas ovelhas, pastores e Reis Magos. O menino Jesus. Não era o mesmo, mas era Ele.
Como foi parar ali? Quem o colocou?
Olhei em volta e vi o Juliano, meu amigo Julião, ainda sorrindo. Como ele sabia? Como era possível?
Saudades meu amigo.
Obrigado e Feliz Natal.