quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Cãovid19

 


A balburdia e bagunça era tanta, que não consegui me conter.

- Calados! – Meu latido foi tão alto que meu dono saiu na varanda para ver que barulheira era aquela.

- Twoo... O que está acontecendo? Que bagunça é essa? – Falou o homem com as mãos na cintura, se mostrando nervoso.

Imediatamente nos separamos e fui ao seu encontro com o rabinho balançando, tentando convencê-lo que nada estava acontecendo.

Tudo começou com a história de uma tal pandemia. Nossos donos de repente não saiam mais de casa, sempre pareciam com medo de algo, ninguém ia trabalhar e o pior.... Acabaram-se os passeios no final da tarde. Um absurdo!

Nos primeiros dias, até foi legal ter todo mundo junto, a toda hora, sempre. Até que começou a nos cansar. Eles pareciam sempre nervosos. Aqui em casa somos em seis cães e, logo, cada um vinha com alguma reclamação para mim. Tipo: “Não passeamos mais”, “estão atrasando nossa hora de almoço”, “ nem o número dois, posso fazer sossegado”, “não pode mais falar com a cachorra do vizinho que alguém reclama”. Por mais que eu tentasse acalmar as coisas, eles tinham razão. Algo precisava ser feito.

Numa noite dessas, comecei a conversar com o amigo da rua de cima. Acho que todos de casa dormiam e nem perceberam minha troca de latidos com o Casca. Ele era um mestiço e muito grande, mas não tanto quanto eu, um Pittdor ou Labrabul, já que mamãe era Pittbul e papai um Labrador. Mas ele latia tão forte que conseguimos conversar, apesar da distância. Ele reclamava que estava ficando maluco com seu dono. Também não saia mais de casa, nem para ir cãobelereiro, fazer sua tosa. Estava peludo demais e mal enxergava por onde andava, tamanha sua franja caindo no rosto. Vivia trombando pela casa.

Um dia desses ele descobriu a causa de todo esse comportamento e nos contou. Havia uma coisa que estava atacando nossos donos. Um Vírus!

- Foi exatamente assim que o chamaram: Cãovid19. Acho que pensam que fomos nós que passamos isso para eles, por isso estão nos punindo.

- Casca, não pode ser. Nunca ouvi nada sobre esse Cãovid19. Eles nos tratam bem, sempre tem um agrado ou carinho como antes, só não querem passear conosco. Aliás, nem eles mesmos saem. A única coisa estranha mesmo, é quando voltam da rua com aquele pano na cara,

Resolvi juntar os outros cinco daqui de casa para tomar alguma atitude. Afinal, se eles estão com medo, temos que nos ajudar.

- Então é isso pessoal, o problema é essa Cãovid19.

- Eu posso morder a almofada agora?

- Não, Bonnie, estamos conversando, presta atenção. O que podemos fazer para ajudar nossos amigos e mostrar que não temos nada a ver com isso?

- Podemos morder mais almofadas.

- Não, Bonnie! Eles não gostam. Pode parar com isso? É por isso que vamos mudar algumas coisas para deixá-los mais tranquilos: Tom, você vai parar de brigar com a Delinha, Vocês não se cansam disso? Delinha vai deixar de morder a Rajeline no focinho toda hora, isso machuca. E Rajeline vai deixar de dormir na poltrona deles...

- Espera aí! O que tem a ver dormir na poltrona?

- Raje, você não apenas dorme, mas está comendo a poltrona toda. Eles vivem brigando com você.

- Mas é tão gostoso...

- Não pode.

- E morder as almofadas?

- Não, Bonnie, também não pode. Eu já disse. Precisamos mostrar que estamos com eles e não os irritar mais. Eles precisam de nós para ficar mais calmos.

- Taylor, não coma mais a comida da Bonnie.

- Ele está comendo minha comida?

- Pelo amor de Santa Canina, Bonnie. Largue dessa almofada! Ele come todos os dias e você nunca viu?

De repente nossa dona saiu e nos chamou. Interrompemos a assembleia e fomos correndo para ver se era algum petisco, mas era só para ela fazer nossa contagem.

- Um, dois, três, quatro, cinco... Cadê a Bonnie? Bonnie!! Larga dessa almofada! Pera aí que você vai ver só.

Assim que ela voltou para dentro da casa, nos reunimos novamente.

- Está vendo como ela está estranha, nos chamou e nem nos deu comida.

- Deixa disso, Taylor. Você só pensa em comida! Estamos todos entendidos? Se agirmos assim eles ficam mais tranquilos e calmos, até descobrirmos mais sobre esse Cãovid19.

- Agora posso morder a almofada?

- Não! – Todos latiram.

Diante de tanto barulho, nossos donos saíram novamente para ver o que acontecia. Então conversaram, algo olhando para nós e a mulher chamou Tom e Delinha para passear na rua. O homem sentou no gramado chamando a mim e ao Taylor para brincar. Os demais ficaram vendo o passeio dos nossos amigos pelas frestas do portão, esperando por sua vez.

Acho que eles não pensam que somos os causadores dessas mudanças. Na verdade, acredito que podemos ajuda-los a passar por mais essa adversidade que a vida criou.

Assembleia encerrada.

Em tempo...

Bonnie, larga essa almofada!



Conto premiado no projeto Apparere: Coletânea Todo mundo em casa?! - Reflexões de um Pet. Editora Perse

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