Como ele nunca acreditou nessa coisa de sobrenatural, nunca teve medo de deixar a namorada naquele sítio e ir pra casa tarde da noite, andando quase dois quilômetros entre silêncio, estrelas e luar.
Por mais que todos dissessem a ele que era perigoso ou por mais que realmente se sentisse temeroso, confiava que nunca lhe aconteceria nada. E ele estava certo, pelo menos até aquele dia.
Justamente naquele sábado, ele estava de bicicleta. Ele só a usava quando estava cansado ou estava com sua amada, então cortavam caminho por um pasto enorme, seguindo a trilha já marcada pelos cavaleiros que iam e viam da cidade para aquelas paragens. Ele chegava tocando a campainha que adaptara no guidão da bicicleta, então colocava Rita no cano do quadro e iam para a cidade assistir algum filme ou em alguma festa e voltavam da mesma forma.
Naquele sábado a lua estava linda, clara, facilitando o retorno tranquilo, portanto ficaram até um pouco mais tarde na quermesse da igreja. A noite havia sido muito agradável e divertida. Ele ganhará para Rita, nos tiros de espingarda de pressão, uma linda vaquinha de pelúcia. Logo que viu a barraca de tiro, ele arrastou a namorada até lá e prometeu ganhar um bichinho para ela.
Apesar do passeio agradável, não voltaram muito tarde. Chegou como sempre tocando a campainha para chamar a atenção de todos e ainda teve tempo de apreciar o café da sogra, que insistiu para que ficasse e dormisse por lá, porém, ele disse não achar certo e que deveria ir pra casa. Sua querida namorada também insistiu para que ficasse, porém, ele continuava afirmar que precisava ir embora, mas que retornaria no fim de tarde do dia seguinte para comerem juntos um cural que a sogra faria.. E assim se deu. Ele pegou sua bicicleta e partiu, voltando-se sempre para trás e acenando para a amada.
O domingo chegou e Rita com a família foi para a cidade assistir a missa. Na verdade não iram neste fim de semana, mas Rita acordou deprimida e com vontade de ir, convenceu a família e todos foram.
Na igreja encontraram-se a uma certa distância, com a família do amado e acenaram em cumprimento. Por mais que Rita buscasse com os olhos por seu querido, não o encontrou. Provavelmente como chegou tarde em casa, decidira ficar mais tempo na cama. Que dorminhoco, ela pensou enquanto sorria.
Mal acabou a missa e retornaram pra casa. Rita ainda tinha que limpar e prepara o milho para que a mãe aprontasse o cural para o café da tarde. Sabia que o noivo viria e adorava cural com café fresquinho.
Mas naquela tarde, ele não apareceu.
Rita estava inquieta e nervosa. Seu amado nunca faltava a um compromisso, ainda por cima com as delicias que ele tanto gostava. O dia se foi e nada dele aparecer.
No inicio da noite, muito preocupado e vendo o nervosismo da filha, o pai de Rita arrumou a charrete e partiram para o sítio do genro. Quando chegaram ao sítio pegaram o pai do noivo preparando um cavalo, ia na casa da noiva procurar o filho. Deu-se um pânico geral. Cada família achava que o rapaz estava na casa da outra. Os homens se organizaram pra fazer uma busca nas redondezas enquanto as mulheres tentavam acalmar a mãe e a noiva do rapaz.
A madrugada já estava indo embora quando os cavaleiros voltaram e sem o rapaz. Não o acharam, em lugar algum e ninguém o tinha visto desde o sábado na quermesse da igreja. Ele sumiu sem deixar vestígios.
Durante aquele mês, foram feitas várias diligências em busca do rapaz, mas sem resultado algum. A Rita estava se definhando, não comia mais direito, mal dormia e só chorava. Na redondeza diziam que o rapaz havia ido embora com alguma mulher ou que o haviam morto e enterrado seu corpo em algum canto daqueles enormes pastos que avizinhava a região.
Mais alguns meses se passou e muitos desistiram da procura, já achando que realmente ele fora embora pra longe. Apenas Rita, já muito diferente daquela moça vistosa de sorriso delicado, aguardava a volta do amado. Muitos diziam que ela já não funcionava bem da cabeça, pois, toda tarde de sábado colocava sua cadeira no terraço e ficava até o final do domingo, olhando para a entrada do sítio esperando seu amado. Sua mãe tinha que levar comida e água até ela, para que não ficasse sem comer ou beber nada.
Era um sábado, num final tarde onde o sol já se escondia, cinco anos depois do acontecido, que de repente Rita levantou-se da cadeira enquanto olhava fixamente para a porteira do sítio, dando um passo a frente. Apontando o indicador naquela direção e disse:
- Ele voltou... Ele voltou!
Ao ouvi-la dizer aquelas frases insistentes, todos que tomavam café dentro da casa, inclusive a família do ex-noivo que os visitavam, saíram para o terraço se atropelando indo aonde Rita estava. Olharam para a direção da porteira e viram ela se abrir e depois de alguns segundos fecharem-se novamente. Aguçaram os olhos para enxergarem melhor, enquanto ouviam Rita dizer sorrindo:
- Ele voltou! Ele veio me buscar... Ele voltou!
Mas não tinha ninguém na entrada e não entendiam como a porteira abriu e fechou sozinha. Ficaram olhando entre a Rita e a porteira, sem entenderem o que acontecia. Então ouviu-se ao longe vindo da direção da porteira, um tilintar de campainha. Era aquele mesmo som que sempre o rapaz fazia quando chegava com sua bicicleta para visitá-la.
Rita, sob o olhar de todos, caiu de joelhos e antes que alguém pudesse entender o que acontecia e ampará-la, deixou seu corpo tombar para o chão.
O barulho da campainha parou naquele mesmo instante. Rita tinha partido com o seu amor.
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