sábado, 2 de fevereiro de 2013

Guerra de espirrador

Antes que possam entender errado o título, convém explicar que o espirrador era uma garrafa plástica, que enchíamos de água e jogávamos um no outro na época do carnaval. Também a chamávamos de seringa, mas nos dias de hoje, para melhor compreensão e evitar uma possível má interpretação, é melhor chamá-la de espirrador.

Sempre ficávamos ansiosos para comprar o espirrador na época de carnaval. Eram geralmente de 1 a 2 litros, de um plástico bem flexível, as vezes sanfonado e, que tinha um bico por onde esguichávamos água nos colegas.

Brincadeira sadia, que não era muito do gosto de nossas mães devido ao grande gasto com água, mas nos rendia diversão garantida, no quente verão dos idos anos 70.

Estudávamos na parte da manhã e retornávamos por volta das 12 horas, mas não antes de programar uma batalha de água contra os garotos da rua de baixo ou com a rua de cima, nossos eternos rivais. Eram rivais em tudo. No futebol, na escola, na guerra de espirrador, nas brincadeiras e até na disputa de namoradas.

Era uma tarde muito quente quando chegamos da escola. Almoçamos como pato, assim dizia mamãe por não mastigarmos direito e engolirmos rápido o almoço, isso em razão da pressa de se preparar para guerra de espirrador.

Naquela tarde, a guerra aconteceria mais cedo, por volta das 14 horas, mais tarde eu e minha família íamos comer uma pizza para comemorar o carro novo de meu pai. Então tudo tinha que ser rápido.

Enquanto enchíamos os espirradores combinávamos estratégias para pegar os moleques da rua de baixo de surpresa. Algumas vezes, nos escondíamos em cantos ocultos, esperando para que quando passassem em direção a nossa rua, pegá-los de surpresa.

Estávamos em um bom número e pelo nosso plano, sairíamos bem secos do confronto. Confronto, aliás, que na verdade, hoje não vejo muito sentido, afinal todos adoravam se molhar.

Às vezes, sobrava até para carros que passavam pela nossa rua com vidros baixos. Espirrávamos e corríamos. Muitas vezes o motorista parava e soltava um bocado de palavrões e iam embora, outras, a coisa complicava. Saiam do carro buscando os autores. É claro que éramos os donos da rua, conhecíamos cada palmo das casas e becos, então ninguém nunca foi pego.

Com todos já ocultos esperávamos os rivais impacientes e nada deles aparecerem. Após quase uma hora percebemos que não viriam. Com certeza "amarelaram", ficaram com medo de nos enfrentar. Então resolvemos brincar entre nós mesmos.

Tudo estava indo muito bem e muito divertido, até que o Luiz santista viu um carro subindo a antiga rua Leonardo da Vinci e deu o alarme. Era um Itamarati vermelho. Sabíamos que não era do bairro, pois nunca o havíamos visto por ali. Vimos que ele vinha lento, seria fácil dar um bom banho nele. Orientei a turma e nos preparamos disfarçando desinteresse, alguns se esconderam atrás de muros e esperamos sua aproximação. Quando estava bem próximo, saímos dos esconderijos e partimos com os espirradores prontos.

Quando sai do esconderijo e dei o primeiro espirro, congelei assustado. Era papai e seu carro novo.

Não deu tempo para impedir e alguns espirros atingiram o carro e ele. Os colegas foram também pegos de surpresa, ao ver que era o seu Nelson quem freava o carro já todo molhado. Sumiram como por magia, não ficou nenhum, apenas eu, congelado e assustado com o espirrador na mão.

É claro que não fui comer a pizza naquele dia. 

Fiquei um mês de castigo, sem sair de casa, perdendo todo o carnaval e as guerras de espirrador daquele ano.

Às vezes, as coisas não dão certo.

Como ia adivinhar?


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