Sábado chegou... Era o meu dia.
Passei a semana inteira, me
preparando para a chegada deste dia.
Na segunda-feira, ainda muito
cedo, lá estava eu na porta do mercadinho do Nagib, esperando o comércio abrir.
O objetivo dessa espera, era a compra do papel azul e branco, para fazer minha
pipa. Não era para uma pipa qualquer, era para fazer "A minha pipa".
Muito especial, sim. Afinal, seria o primeiro sábado das férias e todos os
meninos estariam atrás da minha escola, com suas pipas e eu, também estaria lá,
com minha pipa “Ramalhina”.
Havia guardado meu escasso
dinheirinho, para essa ocasião. Deixei de comer piruá na escola, aquele milho
que não estoura na pipoca, por uma semana. Não comprei sequer um chiclete ou
aquelas deliciosas maria-mole que vinham entre as bolachas de maizena. Valeu o
sacrifício, agora eu saia do Nagib com duas folhas nas cores que mais gosto.
Cores do meu querido time, o Ramalhão. Guardei-as com carinho no alto de meu
guarda roupa para que não amassassem.
Na terça-feira fui atrás de
conseguir gomos de bambu e comecei a preparar as varetas. Logo mamãe apareceu
para pegar no meu pé. Essa arte de afinar varetas realmente fazia muita
sujeira. Tive que limpar tudo e me mandar dali, mas antes da hora do almoço as
varetas estavam prontas. Então as medi, comparei e senti seu peso. Estavam
perfeitas. Como sempre sai atrasado para a escola. Sorte a minha, ser a última
semana de aula.
Quarta de manhã. Deixei pronta
a armação da pipa. Primeiro coloquei a vareta superior, deixando a armação como
uma cruz, medi os dois pedaços da vareta, para garantir que estivessem no mesmo
tamanho, bem firme e centralizado na cruz. Depois enrolei a linha em espiral,
descendo para a segunda vareta. Repeti a mesma operação anterior e contornei a
armação deixando a vareta inferior envergada para baixo.
Sei que devem achar meio
confuso, mas é uma arte que levei muito tempo para aprender e não posso ir
falando assim... Mas ela ficou perfeita.
Restavam apenas dois dias de
aula e então estaria de férias. Estávamos na quinta-feira. Comecei fazer a
rabiola. O rabo da pipa. Cortei metade de cada folha, dobrei-as uma, duas, três
vezes e cortei as tiras. Eram muitas, afinal a rabiola tinha que ser bem grande
e vistosa. Estiquei a linha pelo quintal e comecei a amarrá-las, uma a uma.
Quase me atrasei novamente para ir à escola e só fui me aprontar, quando mamãe
ameaçou não me deixar sair no sábado. Meu banho foi de 2 minutos... E mamãe
olhou-me assim, como que não aprovando, mas já era tarde. Sai em disparada rumo
a escola.
Quando acordei na sexta-feira,
sabia que era o grande dia de encapar a pipa, mal tomei meu café. Geralmente era
acompanhado de bolachas maizena, desmanchadas numa caneca de café com leite ou
uma deliciosa sopinha de pão. Um pãozinho francês, muito bem picadinho,
misturado na caneca de café com leite e um pouco de açúcar. Hum... Era uma
deliciosa maneira de se tomar café. Mas não tinha tempo, então foi apenas o
café com leite mesmo.
Na mesa da cozinha, juntei as
duas folhas de papel, ficando metade azul e metade branca. Coloquei a armação
sobre o papel e a virei para todo lado, tentando achar a forma ideal. Mamãe me
ajudou a escolher e ficamos com a forma diagonal. A parte azul ficaria em baixo
e a branca sobre ele. Ficou legal, então com cuidado cortei e colei na armação.
Enquanto secava peguei a rabiola, amarrei na parte inferior da pipa e coloquei
o estirante. O que é isso?
Vocês não sabem nada de pipa
mesmo... Rsrsrs
Estirante, é onde amarramos a
linha para empiná-la.
Pronto! A mais bela pipa que
fiz estava pronta para subir aos céus. Sai novamente correndo para escola.
Sábado de manhã. Um lindo sol
já se destacava no dia. Seria um dia lindo e os meninos já saiam de suas casas
com suas pipas indo em direção ao morro, atrás da escola.
Tinha pipas de tudo quanto é
jeito e cores, mas percebi que todos ficavam olhando e comentando sobre a
minha. Começamos a empiná-las.
Nunca tinha visto um céu
assim... Tão cheio de pipas. E eram muitas. Começamos as brincadeiras de
desbicar e perseguir outras pipas...
Ah não! Isso nem precisa
explicar, né.
Então apareceu uma pipa
vermelha, com a rabiola branca e começou a cortar as linhas de todas as pipas.
Mas como? Como ele conseguia
isso?
NÃO! a minha pipa azul e
branco, Não!...
Diacho! Lá se foi minha pipa
também. Nem corri atrás dela, estava muito bravo. Então fui saber quem fez isso
e por quê?
Não achei o tal menino, mas
descobri como. Diziam que ele usava uma tal de linha com cerol, que um primo
trouxera lá de Santos para ele. Menino feio e bobo. Perdi minha pipa por sua
causa.
O chato é que nas semanas
seguintes, quase todos os meninos começaram a usar esse tal de cerol e eu...
Nunca mais fiz ou soltei uma
pipa.
Por que sempre tem alguém
fazendo coisas assim, para nos deixar tristes?
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