Convidei alguns
amigos e o Mano véio, mas ninguém quis ir. Ramalhão mesmo, de verdade, só eu.
Então, fui sozinho mesmo.
O jogo
seria difícil, afinal, o adversário seria o temido XV de Piracicaba, time
tradicional do interior paulista. Eu não tinha duvida que seríamos campeões. O campo da disputa seria no antigo
Parque Antártica do Palmeiras, clube que com o passar dos anos, nos teria como uma pedra no sapato, mas isso é outra história.
Como na época eu
participava da torcida uniformizada, iria com o ônibus fretado que partiria da
prefeitura municipal, na verdade eram vários ônibus que levariam gratuitamente
quem quisesse ver o confronto. O ônibus que entrei, era já um tanto velho de
uma empresa da cidade vizinha, Mauá. Mas o que me importava mesmo, era que eu estar dentro dele. Eu iria ver o Ramalhão!
Logo de cara, já
dentro do ônibus lotado e sem ninguém que eu conhecesse, apareceu uma garrafa
de whisky na minha mão, não sei de onde ela surgiu e muito menos qual era a
marca, então começou o coro "Vira, Vira...", e eu virei.
Partimos de Santo
André num frenesi tremendo, cantarolando e gritando "`O glorioso é o campeão". Logo
outras garrafas começaram dar as caras, cachaça, vinho, mais whisky e sei lá eu, o que mais. Naquela altura já nem sabia mais o que bebia, então comecei a
maneirar. Só sei que cheguei ao estádio sem minha camisa e com uma bandeira
jogada nas costas.
Fui entrando no
estádio levado pela turma. Confesso que nem me lembro da cara do estádio ou de
como eu chegará ali no meio da arquibancada. Quem pagara o meu ingresso? Acho
que eu não estava muito bem, então resolvi ir ao banheiro lavar o rosto e tentar
me recuperar um pouco.
Quando voltei, não
sabia mais onde estava a turma do ônibus. Estava perdido naquela imensidão de
gente. Mas tudo bem, eu viera para ver o jogo e ele já ia começar. Como não era
lá muito alto, mal conseguia ver o jogo e na base do "Dá licença", fui
abrindo caminho e cheguei ao gargarejo, na cara do campo.
Era minha noite,
até então nunca tinha vibrado tanto, nem mesmo no nosso primeiro título em
1975, na época eu era um garoto que se apaixonava por este clube. Já estava ficando rouco, louco
e um pouco de tudo. Meus ídolos eram o Fernandinho e o Lance, um jogador
já veterano.
E assim o jogo rolou, fácil para nós.
E assim o jogo rolou, fácil para nós.
Faltavam cinco
minutos para o final, vencíamos de 3x1. Acho que toda minha agitação com o jogo
me fizera transpirar muito, jogando todo aquele excesso de álcool pra
fora. Resolvi sair dali e ir para o ônibus antes do jogo terminar. Já que não
estava muito bem, pelo menos chegaria logo, sem riscos de ser atropelado pela
multidão.
Até que achei o
nosso ônibus rapidinho e entrei. Como eu, mais três colegas tiveram a mesma
ideia e começamos a conversar e comemorar o título.
De repente o
motorista fechou as portas e disse:
- Vamos embora os
torcedores do XV estão saindo e vindo pra cá.
Como assim irmos
embora? E os outros colegas?
Nem deu tempo para
perguntar, logo uma pedra arrebentou um das janelas. O motorista ligou e
acelerou o ônibus. Deitamos no chão debaixo dos bancos enquanto mais pedras
quebravam outras janelas, jogando vidros por toda parte. Foi assustador.
Ali, encolhidos e
quietos, percebemos as manobras do motorista que saia em alta velocidade do
estacionamento, onde havia parado.
Foi um grande susto.
Fora alguns arranhões e pequenos cortes, tudo ficou bem. Até chegarmos ao centro de Santo André.
Quando passávamos
pela prefeitura o motorista parou o ônibus e pediu para descermos. Isso era
perto da uma da madrugada, mas descemos sabendo que neste
horário não haveria transporte público para casa.
Os colegas, como
estavam juntos, foram embora a pé mesmo e lá estava eu, no centro de Santo
André, muito longe de casa, sem camisa e enrolado na bandeira do Ramalhão. Numa
madrugada fria pra caramba.
Já que não tinha
jeito, fiquei por ali mesmo, comemorando com as dezenas de andreenses, que começaram a encher o centro, até
circular o primeiro ônibus.
O duro foi
explicar em casa a minha condição e trabalhar no outro dia todo dolorido.
Mas com a gente é
assim mesmo, uma vez Ramalhão... Sempre campeão.
Valeu todo o sacrifício.
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