Eu
já estava no ônibus, indo para casa, quando José subiu.
Era
um dia especial. Havia acordado muito cedo e fui participar do almoço de Natal
com meus filhotes. Fora um dia muito feliz, com todos os filhotes a minha
volta.
Estava
naquele momento, pegando o primeiro dos três ônibus que fazia parte da longa
jornada de volta para casa, este indo rumo a rodoviária de São José dos Campos.
A primeira parte das quatro etapas de meu percurso de regresso, eu fiz de
carona com meu filhote mais velho. Ele trouxe-me de moto até o centro da
cidade, para que eu pegasse esse ônibus. Agora, já sentado no banco do ônibus,
trazia preso entre minhas pernas, a surrada mochila e na mão, o também já muito
surrado, capacete (sabia da carona do filhote, então me preveni. Andar sem
capacete, jamais).
Já
estava tranquilo e ajeitado, sentado no banco logo ao lado do cobrador. No meu
MP3, Rammistein soltava a voz com Mein Teil. Logo no primeiro ponto, depois de
onde subi, o motorista parou e ele entrou.
Inevitável
não chamar a atenção. Tinha tatuagens até no pescoço. Trazia nas costas uma
mochila enorme, suja e um tanto maltratada. Preso a ela, como se estivesse
agarrado para não cair, um pequeno leãozinho, desses de pelúcia. Lembrou-me
muito o Léo, o leãozinho do meu filho, quando pequeno. Mas isso é outra
história...
Já
havia passado por mim, quando voltou, olhou-me e sorrindo disse:
- Janis Joplin!
Fazia
referência a estampa da minha camiseta. Era toda preta com a imagem de Janis
sorrindo e amparando seus óculos azuis com a mão. Pediu licença, colocou sua
enorme mochila no chão e sentou-se ao meu lado.
Ele
parecia um andarilho. Trazia na cabeça, um daqueles chapéu rasta com as cores
da Jamaica, prendendo um cabelo tipo Bob Marley. Sua barba grande e maltratada,
lembrava Raul. Uma figura exótica sem dúvida.
Sua
mochila era impressionantemente grande, na cor caqui. Trouxe-a mais próximo aos
pés, ajeitou o pequeno leão e estendeu-me sua mão.
-
Sou José de... Só José mesmo.
Repeti
seu gesto apertando-lhe a mão, por sinal muito firme e apresentei-me.
-
Cara, eu sentei-me aqui porque vi sua camiseta. Eu adoro a Janis. As pessoas
esquecem muito rápido de tudo.
Retirando
o fone do ouvido e desligando o MP3, comentei.
-
Verdade. Eu a curto muito também.
José
me parecia ser uma boa pessoa, apesar de sua aparência rústica e um cheiro
forte de suor. Estava indo para Ubatuba no litoral, vivia da venda de pequenos
artesanatos. Viera para o Vale do Paraíba, passar o Natal com amigos e
regressava depois de dois dias em Jacareí. Esperava boas vendas nos dias que
antecedia a virada do ano, a movimentação na praia seria muito grande.
Conversamos
um pouco mais sobre músicas, Janis e descobri que tínhamos mais uma coisa em
comum no mundo da música. Ambos gostávamos de John Lennon, o melhor dos rapazes
de Liverpool. Pobre Paul.
Após
alguns minutos, José de repente ficou calado e baixou sua cabeça. Pensei até
que ele estava cochilando e então, começou a estralar os dedos, criando um
ritmo e começou a cantar:
- Oh
Lord, won't you buy me a Mercedes-Benz? My friends all drive Porsches, I
must make amends...
Era
um clássico de Janis Joplin, Mercedes Benz. Todos começaram a olhar em nossa
direção. Ele chamava mais a atenção, pelo tom firme e suave que cantava. Sabia
realmente a letra. Levantou lentamente a cabeça, virou-se para mim dizendo:
-
Pensa que não conheço Janis? Vamos lá cara, cante comigo.
Fiquei
atônito e meio sem jeito. E ele insistiu:
-
Vamos lá, me acompanhe.
Não
sabia o que fazer, enquanto todos olhavam para nós e ele repetia o início da
música, agora mantendo o ritmo batendo palmas. Nunca vi ou me aconteceu algo
assim.
Então
o cobrador, que estava logo atrás de mim, bateu em meu ombro e incentivou-me:
-
Canta.
Ele,
um rapaz com aproximadamente de 25 anos, também começou a estralar os dedos. E
então começamos um dueto. No início muito tímido depois mais solto. E não é que
ele sabia toda a letra da música? Enquanto eu o acompanhava em apenas algumas
partes.
Apesar
do mau jeito, quando acabamos recebemos até palmas e assovios. Pode ser isso?
Acho que eu estava mais vermelho que um tomate, e olha que não sou tão tímido
assim.
Foi
tudo inusitado, natural e muito legal. Nunca me vi cantando em público assim,
especialmente dentro de um ônibus, quanto mais Janis. Quando penso que a vida
já me aprontou de tudo, acontecem coisas assim. Incrível o que o Natal nos
faz.
Foi
massa. Só faltou o mais importante, registrar aquele momento através de uma
foto. Sempre deixo escapar esses momentos, deve ser por não gostar muito de
tirá-las.
Obrigado
José, que Deus lhe permita viver muito mais experiências e curtir a vida.
Um
abraço e até qualquer dia.
- Oh
Lord, won't you buy me a Mercedes-Benz.
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