Nunca fui de me impressionar com as coisas deste mundo — e do
"outro" mundo, então, menos ainda.
Sempre que meus amigos começavam a contar histórias sinistras, falavam de
vultos, de objetos voando sozinhos, eu ria e dizia: "Nunca vi, nunca
ouvi. Nem sei como me comportaria se visse."
Cresci ouvindo relatos de vizinhos sobre aparições: sombras
que se moviam, imagens que evaporavam no ar. Havia, inclusive, uma casa perto
da minha, onde diziam acontecer coisas estranhas. Minha curiosidade me levava
até lá, principalmente quando alguém jurava que "dessa vez" tinha
visto algo.
Mas, sempre que eu chegava, o cenário era o de sempre: silêncio, calma
absoluta. Talvez por isso, as histórias nunca me preocuparam.
Até aquele sábado de outubro.
Era um fim de semana tranquilo. Em casa, apenas eu e meu
velho companheiro — o restante da família tinha viajado. Eu não via problema:
algumas comidas instantâneas, cerveja, uns salgados e, claro, o tão querido
silêncio.
O dia passou sem sobressaltos, e a noite chegou serena.
Assisti a alguns filmes — nada de terror, apenas uma comédia romântica
divertida — e acabei adormecendo no sofá da sala, embalado pelo cansaço da
semana puxada.
Foi então que escutei três batidas secas na parede.
Acordei de imediato.
A porta da sala, como de costume, estava entreaberta.
Fiquei imóvel, tentando entender o que tinha ouvido. O silêncio se estendia
como um manto pela casa... até que vieram novas batidas, agora ainda mais
claras, bem atrás de mim, na parede em que o sofá estava encostado.
Virei lentamente o corpo.
E então o vi.
Perto do interruptor da luz, estava ele: uma figura com
aparência de arlequim, vestindo roupas em xadrez preto e branco.
Tentei gritar, chamar alguém, mas minha voz não saía. Meu
corpo inteiro parecia petrificado, prisioneiro de um medo ancestral que eu nem
sabia carregar dentro de mim.
Mesmo sem mover a boca, ouvi minha própria voz perguntando —
ou talvez pensando com tamanha força que se materializou — se fora ele quem
causara aquelas batidas.
Ele respondeu que sim, também sem mover os lábios, como numa
espécie de telepatia.
Disse chamar-se Adriano. E que morrera naquela casa.
Embora ele não tenha explicado como, eu senti — num pressentimento tão
forte que doeu — que ele não apenas morrera, mas fora morto ali.
Uma luz muito branca, quase prateada, emanava de suas
costas, envolvendo-o em uma espécie de aura tênue.
Perguntei quem ele era.
Disse que fora cozinheiro, que vivera ali com sua mulher.
De repente, seu semblante mudou.
Ficou sério.
Olhou para o lado, como quem pressente algo terrível. Depois, encarou-me
novamente e disse, apressado, olhando da porta da sala para mim:
— Ela está vindo. Preciso ir!
E foi.
A luz que o envolvia apagou-se de uma vez, mergulhando o
cômodo no breu habitual.
Fiquei ali, imóvel, tentando entender se aquilo tinha sido
real... ou se tudo não passara de um sonho.
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