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Juntos pra sempre.
Afinal, águias não vivem no meio da mata fechada
— seu lugar é nos altos picos das montanhas, bem longe do chão... e muito menos
ao lado de uma loba.
Alguns diziam que eram fruto de uma antiga maldição, lançada
por um bruxo tomado pelo ciúmes de dois amantes — para que jamais pudessem
ficar juntos.
Mas a verdade era mais simples... e mais bela.
Lá do alto, um som agudo ecoava por entre as copas das
árvores, denunciando onde a Loba escondia a presa.
E ela, saltando entre pedras e raízes, a encurralava.
Teriam o que comer mais tarde.
Assim viviam: Águia e Loba.
Todos os dias e noites ajudando-se.
Um cuidando do outro.
Quando aqueles que provocavam o estampido se aproximavam, a
Águia, do alto das árvores, alertava a Loba, que corria entre os galhos secos,
atraindo os intrusos para longe.
Enquanto isso, a Águia ganhava os céus e voava até o alto da montanha — e lá,
sempre, eles se reencontravam.
Ficavam juntos, parados, observando a floresta até o perigo
passar.
Depois, desciam novamente.
Não havia maldição.
Não havia encantamento.
Eram apenas dois animais distintos, vindos de mundos muito diferentes...
Mas que sentiam, de alguma forma, que ficariam juntos por toda a vida.
A Loba sabia que aquela realidade não era sua.
Seu destino era o norte — as terras geladas, solitárias.
Mas ela relutava.
Mesmo ciente da distância natural que a separava da Águia, insistia em ficar.
A Águia, por sua vez, sabia que também não poderia
permanecer ali para sempre.
Seu mundo era outro — os céus abertos, o vento, a liberdade.
Mundos que jamais conseguiria oferecer à Loba.
Ambos sabiam que, um dia, a hora da separação chegaria.
Esse era o destino — já sabido, já aceito.
Mas, até lá...
Seguiram juntos por muitos e muitos anos.
Às vezes se estranhavam — cada um com seus costumes, seus
silêncios.
Em outras, eram pura alegria, como quando ela saltava tentando pegá-lo no ar, e
ele, num voo rasante, se deixava alcançar.
Rolavam juntos pelas folhas do outono, como se o tempo também brincasse com
eles.
No inverno, quando o frio era cortante, a Águia não migrava
com as outras de sua espécie.
Escondia-se com a Loba numa gruta, trazendo pequenas frutas, enquanto ela saía
para caçar.
Dividiam o que tinham, até o sol voltar a derreter o gelo e o verde da floresta
florescer novamente.
Voltavam então a caminhar lado a lado.
Comiam juntos.
Dormiam juntos.
Viviam juntos.
Foi num desses invernos — o mais rigoroso de todos — que
alguns caçadores finalmente os viram.
A Loba, agora velha e cansada, não conseguia mais caçar.
A Águia, com as asas enfraquecidas, não conseguia vencer a nevasca.
Fugiram e entraram juntos na mesma gruta onde haviam passado
tantos invernos antes.
Os caçadores, também ameaçados pelo frio cortante, decidiram
arriscar.
Com armas em punho, adentraram a gruta.
Precisavam se abrigar.
Entraram devagar, olhos atentos.
Mas nada...
A gruta estava vazia.
Procuraram por saídas, marcas, vestígios.
Nada.
Tinham certeza de tê-los visto entrar.
Acenderam uma fogueira, comeram algumas frutas e
adormeceram.
Foi então que ouviram — bem ao longe, mas dentro da gruta — um uivo.
Levantaram assustados, prontos para um ataque.
Mas não havia nada.
Ouviram também o bater de asas...
Mas não havia Águia.
Só então entenderam.
Aquela lenda que muitos contavam, com tantas versões, era verdadeira.
Naquela gruta, naquela floresta...
Existiram — ou talvez ainda existam — uma Águia e uma Loba.
Que viveram juntos.
E que morreram juntos.
A natureza é perfeita.
E para o bem-querer, não existem fronteiras.
Quem tem esperança… que creia.