domingo, 22 de julho de 2012

Turbulência

No retorno de uma viagem à Bahia, como sempre, planejei tudo com muito cuidado. Mas, como de costume, nem tudo saiu como o planejado.

Quem leu o texto "Voo apertado" já sabe que, antes mesmo da ida, tive que lidar com a “solidariedade” de amigos bem-intencionados tentando me animar sobre o voo. Pois bem... Apertem os cintos. Esse é o retorno.

Quer dizer, quase tudo, como sempre. Assim que confirmei o voo de volta, parece que o universo conspirou pra me dar spoilers. Um desfile de pessoas começou a me alertar, como se estivessem combinadas, sobre a companhia aérea que eu havia escolhido. A primeira foi uma colega:


— Ah, não vai pela aquela companhia dos comerciais, hein? Péssima!

Já no aeroporto o taxista que me levou, fez questão de me alertar para não viajar pela mesma companhia, a mesma da colega. Nem perguntou qual era a que eu embarcaria, apenas disse:

— Olha meu amigo, vou lhe dar um conselho: nunca viaje por uma tal companhia. É um desastre.

Adivinha qual era a companhia do meu voo? Ela mesma. A lendária, temida, falada companhia alertada pela colega.

Bem, apesar dessas orientações “coincidentes”, como já havia comprado o voo mesmo, comecei a reparar em cada detalhe da nave. Confesso que se tivesse uma chave de fenda a mão, apertaria qualquer parafuso que surgisse a minha frente.

Meus olhos de águia tudo viu, quando de óculos é claro. Logo de entrada notei uma poltrona com o rasgo no encosto. Pronto, meu coração acelerou.

Sentei-me no meu lugar e logo senti o braço da poltrona com jogo, meio solto. Prendi o cinto, chequei tudo, respirei fundo e... relaxa.

Foi aí que começou a confusão.

Um passageiro ocupava o lugar errado, outro exigia sentar-se na janela, mesmo sem direito. Foi um tal de senta e levanta sem fim. Um bebê não parava de chorar, berrava a plenos pulmões. Ao meu lado, um senhor pálido e trêmulo me encarava como quem vai passar mal. Sério. Eu já me preparava pro pior.

As comissárias, já no limite da paciência, imploravam para que todos se sentassem.

— É muito simples, gente. Vejo o número da poltrona no bilhete, senta nela, fim!" — disse, irritado, meu colega de assento.

Doce ilusão.

Um minuto depois, outro passageiro chegou próximo dele e disse:

 – Desculpe senhor, esse lugar é meu.

Meu colega de poltrona também tinha errado. Lá fui eu levantar mais uma vez. Respirei fundo. Sorri por fora, chorei por dentro. Meu Deus! 

Depois de mais algumas reacomodações, finalmente decolamos.

Tudo parecia seguir tranquilo. Já sobrevoávamos Vitória da Conquista quando senti... uma vontade. Uma daquelas vontades inadiáveis. Precisava ir ao banheiro.

Levantei-me com muito cuidado e fui tranquilamente ao banheiro. As comissárias sorriram... Estava tudo bem.

Enquanto iniciava o esvaziamento da bexiga, senti o avião começar a tremer. Do alto-falante, o comandante avisou:

— Senhores passageiros, por favor permaneçam sentados. Teremos uma breve turbulência. Tripulação preparem-se.

O homem anda a 300 Km/h nos céus e ainda não tem noção do que é rápido. Foi a turbulência mais longa de toda minha vida.

Já estava com o zíper aberto e urinando, quando começou a balançar tudo. Já de início fui com as costas na porta do banheiro, muito difícil acertar o vaso sanitário assim, foi tudo pela parede, pia e chão. Tentei me segurar na caixa do papel e começou a sair muito papel em tiras, caindo pelo chão.

Novo solavanco. Agora fui arremessado para frente — direto com as “partes baixas” no vaso sanitário. Juro que o "Ai!" que dei ecoou até Vitória da Conquista. Com tudo ainda à mostra, tentei me reerguer. Me agarrei a uma alavanca e... clic!
Abri a porta.

Sim, com o avião sacudindo, a porta do banheiro parcialmente aberta, papel higiênico voando, e eu — de calças arriadas. Segurei a porta com todas as forças, impedindo que o escândalo fosse maior.

Depois de uma eternidade, a turbulência cessou. Olhei sorrateiramente para fora. Uma comissária vinha em minha direção. Guardei tudo no lugar, juntei os papéis pro canto e joguei tudo na lixeira e quando ela chegou, já estava lavando as mãos.

— Tudo bem, senhor?

— Tudo perfeito, obrigado. — respondi, enquanto saía do banheiro, tentando parecer digno, sob o olhar de quase 100 passageiros, alguns ainda com cara de assustados.

Caminhei até meu assento, tentando parecer invisível. Foi quando ouvi a comissária dizer:
— Senhor, o senhor está arrastando um papel higiênico preso no sapato.

Te pergunto: você pararia pra tirar?

Eu não.

Acelerei o passo e me joguei no assento com a dignidade de quem perdeu tudo, menos o humor. Baixei a cabeça, morrendo de vergonha. Ao meu lado, o velhinho — aquele que parecia à beira da morte — me olhou, abriu um sorriso com seus três dentes e soltou um:

— He, he, he.

Impressionante. Essas coisas só acontecem comigo.

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