sábado, 9 de junho de 2012

Feriado II - Sugestão pro almoço.

A semana tinha sido longa, dessas que deixam a alma pesada. Era o segundo dia de um feriado chuvoso, e tudo que eu queria era escapar da rotina. Com o carro novo na garagem, enxerguei a oportunidade perfeita: uma ida até a chácara do meu irmão. Um descanso merecido e, de quebra, a chance de amaciar o motor novinho.

Levantei cedo e chamei minha garota. Enquanto ela se arrumava, fui mimar o carro. Um pano na lataria, tirando o pó com carinho, e aquele cheirinho bom no interior — desses que fazem o carro parecer um abraço acolhedor. Tudo ainda dentro da garagem, claro, porque a chuva lá fora não dava trégua. Com o som ligado e um cuidado quase cerimonial ao volante, partimos para um dia tranquilo no campo.

A sexta à noite prometia uma peixada já combinada com meu irmão, e ele me encarregou de sugerir algo leve para o almoço de sábado. A ocasião era importante: minha namorada seria oficialmente apresentada à família. O dia seguinte incluía chá com biscoitos, uma sessão de fotos improvisada e, claro, minhas sobrinhas empoleiradas no "tio favorito", em meio a risadas e bagunça.

A chácara era modesta, mas encantadora. Tinha cães, aves, tartarugas e um pomar generoso. Um refúgio. Após a peixada, decidi dormir na rede da varanda, embalado pelo som da chuva mansa. Esperei todos se recolherem, preparei meu cantinho com uma manta grossa, um travesseiro, coloquei Janis Joplin no MP3 e me deitei, pronto para uma noite diferente.

O céu havia se aberto. Era como uma tela viva: um mar de estrelas brilhando em silêncio, sem a poluição da cidade. A lua minguante parecia sorrir para mim. Os grilos cantavam solenes, e tudo conspirava para a paz mais perfeita. Fiquei ali por horas, hipnotizado, até que o sono me levou, leve e sereno.

Ou quase.

Às 5h30, fui brutalmente acordado pelo canto estridente de um galo. O susto foi tão grande que rolei da rede direto para o chão. Com o coração disparado e os cabelos em pé, olhei ao redor procurando o autor daquele escândalo. E lá estava ele. Em pé... no teto do meu carro novo. Andava de um lado para o outro, riscando a pintura com suas garras afiadas e, como se não bastasse, deixando seu “autógrafo” no capô.

Fitei o animal com uma calma assassina e pensei: Acho que tenho uma sugestão para o almoço.

Levantei-me devagar, ainda atordoado, e comecei a chamá-lo com a doçura falsa de quem trama vingança:

— Vem cá, bichinho... vem cá...

O que se seguiu foi digno de uma comédia pastelão: escorregões, batidas na canela, tentativas frustradas de agarrar o danado e alguns grunhidos abafados para não acordar a casa. Até que, finalmente, consegui. Lá estava ele, prisioneiro nas minhas mãos, me encarando com aquele olhar de quem sabia muito bem o que tinha feito.

Um sorriso vingativo começou a se formar no meu rosto... até que uma voz infantil e sonolenta cortou o momento:

— Bom dia, Tchu-Tchu!

Era minha sobrinha de seis anos, a própria personificação da doçura.

— Ah! Você gostou do meu galinho Zequinha, né? Ele não é lindo?

Olhei para o tal Zequinha... e juro que ele sorriu. Um sorriso cínico, daqueles que só os inocentes — ou os galos — sabem dar. Suspirei fundo, reuni o pouco de paciência que me restava e soltei o bicho.

Peguei minha sobrinha no colo, tentando ignorar os arranhões no capô e o cheiro inconfundível de cocô de galo.

Zequinha... só me faltava essa.

Sorte a dele que a tilápia já estava garantida para o almoço. Porque, sinceramente, ele quase virou a estrela do cardápio.


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